domingo, 13 de julho de 2008

O Confidente (ou simples objeto observador).

Olhos fundos e marcas de lençol nas bochechas, ela aparece, toda manhã, levemente mal humorada e sonolenta, realizando movimentos quase que em câmera lenta, entre dois ou três lamentos, dois ou três bocejos.Se dirige ao sanitário, mais por impulso, menos por coragem, e se queda ali, a mão esquerda apoiando a testa, pensando se é necessário um banho ou não, planejando o dia, pensando nele, como em cada minuto de cada novo dia: pensando nele. Ela não me disse mais nada sobre, mas eu conheço bem a expressão do seu rosto ao pensar nele.Talvez agora esteja planeando o percurso até a faculdade e vendo todas as possibilidades de cruzar com ele, mas não, ele dorme até mais tarde nas sexta, e assim ela decide prontamente. - Não preciso de banho. Levanta brusca do acento, lava brusca a cara, escova bruscamente os dentes, troca bruscamente a roupa, apaga brusca a luz,bate brusca a porta e sai, brusca.Não posso vê-la na rua, mas a imagino descomposta, cara de sono, bocejos. O andar torto, desengonçado, apressado e brusco.E durante a aula, provavelmente distraída e ainda sonolenta ela pensará no pênis do professor, pequeno e murcho, sem volume algum sob a calça, diferente do fulano ao lado, altivo e imponente, pernas abertas, grande proeminência sob o zíper. E se imaginou na cama com o professor, na cama com o fulano, na cama com os dois. Depois se deu conta de sua abstinência, que claro, faz ela passar horas pensando coisas assim. Espantou-as da cabeça, tentou em vão prestar atenção na aula do professor-pênis-murcho. E depois de trinta segundos ela pensava no pênis dele, e gostou de imaginá-lo também altivo e imponente e não quis espantar aquilo da cabeça. Ao meio dia ela se despe para mim, mostrando os fartos seios que ela tanto se orgulha, o abdome globoso na parte inferior que ela tanto odeia, se esquia vira de lado, vira de frente, vira de costas. Mãos na cintura, pés na ponta dos dedos, ela me mostra as nádegas também fartas porém flácidas e repete mais uma vez para si mesma que precisa urgentemente recorrer a uma academia. E pensou nele, saciando a fome naquelas carnes fartas e flácidas. Ducha rápida só para aliviar os calores, o do verão e o que exala de algum lugar profundo do corpo dela, muito mais difícil de ser aliviado. Aquele conhecido calor que faz ela pensar em outras coisas, ao invés da disciplina ministrada. Escova os dentes, agora não brusca, mas meticulosa, um a um, incisivos, caninos, molares e pré-molares. Senta na pia de pernas abertas para mim, examina o clítoris, o bem mais precioso dela e de toda mulher, suponho eu. E ao mexer nos grandes e pequenos lábios, novamente pensou nele. Rói e pinta as unhas em seguida, vermelho vivo, vermelho sangue. A casa vazia, ela desabafa. Se assume desacreditada em relação a ele, e auto-confiante em relação aos demais, e mostra-se indigna com a sua postura para os demais, quando os demais, não importam, é nele, é dele, é pra ele cada passo, cada movimento, cada nova fragância, cada roupa, cada peça íntima, cada gesto e cada rima. Anoitece. Banho, hidratante e óleos, desodorantes e perfumes, vestido, calcinha, sutiã não, unhas dos pés escarlates, vermelhas-vivas no salto 15, e ela tentou não pensar nele, passando a língua nelas e a deslizando devagar para lamber a parte interna das cochas. Olha bem pra mim e repete: eu sou linda,eu sou linda,eu sou linda. Ensaia beijos, olhares e poses, passa as mãos no cabelo, pega na bolsa o pouco de dinheiro que uma mulher como ela precisa para sair, embriagar-se, divertir e divertir-se, mãos no cabelo. Meia noite, acusa o relógio, ela espera uma nova proposta tocar a campainha e levá-la a bares,shows e talvez mais tarde cama redonda, espelho no teto. Blim-blom, um último olhar,o mais fatal. Desliga elegante a luz, fecha elegante a porta, e me deixa na escuridão, com os meus míseros um metro e meio de largura por dois de altura: pobre espelho confidente.

"Se acaso me quiseres, sou dessas mulheres que só dizem sim. Por uma coisa à toa, uma noitada boa, um cinema, um botequim (...) Mas na manhã seguinte, nem conta até vinte, se afasta de mim, pois já não vales nada, és página virada, descartada do meu folhetim."

7 comentários:

Samilla Fonseca disse...

Muito bom esse texto, Leo. Muito mesmo.
Lembrei de uma depoimento, a gente nem era essas coca-cola toda de amigos, e tu me mandou essa música do Chico, dizendo que lembrava de mim. Te amo! ;*

Alcântara. disse...

fui comentar.
de que cor são as letras da palavra de verificação? 'vermelho-vivo'
talvez o mesmo vermelho do batom esquecido no espelho... o espelho sujo do banheiro. o espelho 'brusco' dos tapas na cara. a luz apaga. e a mulher, o professor, o dotadão e o narrador se juntam...

ah... esquece... convide-os pra passar aqui em casa.
vinho, cigarros e festa.

Bell Bastos disse...

Adorei o texto.

Mas quando eu falo que aodrei, é porque adorei não só o texto, mas a forma como ela foi escrito.

Vou te confessar uma coisa: Quando eu vejo posts grandes assim nos blogs dos outros, eu fico realmente desanimada, leio no máximo o primeiro parágrafo, ou a primeira parte do texto, e deixo algum comentário qualquer, ou não...

Mas o seu texto foi realmente o único que eu comecei a ler, e fiquei realmente interessada, porque cara, vocE^escreve muito bem! Mesmo! Eu queria que os meus tipois de texto fossem assim, envolventes. Na hora que você vai e fala de quando ela coloca o vestido, e se prepara pra sair, eu gostei demaaais, porque é realmente assim que as mulheres são durante o dia: começam o mesmo brutas e bruscas, aí depois já ficam mais "calmas" e no final do dia estão todas elegantes e "prontas pra festa".

E fiquei mais feliz ainda em saber que eu já sou um dos "outros malucos"! hauahuahauhaua

Enfim, essa foi a primeira vez que eu entrei no seu blog, e já achei maravilhoso, continue assim, sempre.

Aliás, você também já entrou na minha lista SELETA de blogs!

E espero que você sempre possa ler o meu humilde Retilíneo e criticá-lo sempre, porque a sua crítica é uma das poucas que eu realmente quero ouvir, seja ela positiva ou negativa.

Foi mal aí por escrever um comentário desse tamanho só "puxando o seu saco", mas é que sei lá, é o que eu penso.
:D

Ynot Nosirrah disse...

Cara, seu blog também é show. É bastante cultural. Obrigado por ter visitado o meu. Você também é de Sobral? Manja alguma coisa da área de saúde?

Bell Bastos disse...

Nossa, imagina, não me ofendo de forma alguma! Adorei mesmo! :D

Sensacional saber que você gostou do meu blog!
:D

Bell Bastos disse...

Tem uma coisinha pra vocÊ lá no meu bog.

Ciçoca disse...

Gostei, gostei muito!